
Em um mundo pasteurizado por algoritmos, eles defendem a curadoria humana, o calor do vinil e a música como o ingrediente secreto de qualquer boa experiência.
Conhecidos pelo acolhedor Dōmo Bar, projeto de Rodolfo, Flávio e Denis, e também pelo Takkø Café, comandado por Rodolfo e Flávio, o trio se tornou referência em criar ambientes acolhedores em São Paulo. A mesma filosofia de curadoria se estende para além do serviço: eles são o Batch Brew, um coletivo de DJs que trata a música como o ingrediente essencial para envelopar qualquer experiência. Unidos pela paixão pelo vinil e pela busca da “atmosfera certa”, operam como um antídoto ao streaming pasteurizado. Nesta conversa, o trio fala sobre a arte de criar um clima, o processo intuitivo de tocar junto e por que uma boa trilha sonora é, no fundo, um ato de conforto e resistência. Sinta o som, além das palavras!
Vocês são anfitriões no Dōmo e no Takkø, e o Batch Brew parece ser a trilha sonora dessa mesma filosofia. Como a arte de criar um ambiente e uma experiência em um café ou bar se conecta com a arte de construir um DJ set?
Acho que, em ambos os casos, é uma eterna tentativa de criar a atmosfera certa para o momento. No caso do Takkø, por exemplo, temos diversas playlists e seguimos criando novas com frequência, porque para nós a música é tão importante quanto o que estamos servindo. É o que envelopa a experiência como um todo, a cereja do bolo, e estamos sempre observando que muitos lugares acabam se esquecendo da função que um bom conjunto de canções pode exercer.
O Batch Brew é uma continuação natural da nossa relação com a música, que vem lá de trás, antes mesmo da existência do café, e a união de três coleções de discos e gostos que se complementam, mas que também divergem de vez em quando, felizmente.
No fim das contas, é sobre a busca pela atmosfera que queremos entregar, seja no café ou no bar, e a música é um pedaço indispensável do todo.
Como funciona o processo criativo de vocês três juntos? É uma conversa, um debate ou as coleções de cada um se misturam de forma mais intuitiva na hora de tocar?
A gente se entende sem ter que dizer muita coisa. Não tem muito debate, geralmente pensamos em um tema (que não necessariamente vem de um gênero único) e a partir daí levamos os discos para tocar, sem nunca saber o que o outro está carregando no case.
Dessa forma, os sets ficam muito mais orgânicos e soltos, e também demandam uma atenção maior quando estamos de frente para os toca-discos, com ouvidos abertos para o que o outro está tocando.
Hoje, muitos descobrem música por vias puramente digitais. O trabalho de vocês, ao contrário, está muito ligado à criação de uma atmosfera em um espaço físico. Qual a importância de uma trilha sonora bem pensada para a experiência real de um lugar, algo que o algoritmo do streaming não consegue replicar?
Na nossa visão, é uma das coisas mais importantes para um lugar físico. Tem outra coisa: com tanta gente descobrindo música através de algoritmos e IA, é muito gratificante alguém chegar e elogiar nossas playlists, porque elas foram pensadas com carinho para casar com a experiência de tomar um café no Takkø.
No caso do Dōmo, nada melhor do que ver gente ligando o Shazam (ou conversando com o seletor da noite) para tentar descobrir o que está tocando. É, de certa forma, um ato de resistência a um mundo onde o streaming é rei e tudo fica cada vez mais pasteurizado e sem graça.
Por que o nome “Batch Brew”? O que esse método de preparo do café, que serve muitas pessoas com qualidade, diz sobre a intenção musical de vocês como um coletivo?
O nome é um aceno ao método de preparo citado, que tem exatamente essa função: entregar café de qualidade a um número maior de pessoas pelo menor valor possível. Levando isso para o som, dá pra dizer que o mesmo vale para nossos sets em vinil: a intenção não é transformar a música em algo exclusivo para um seleto grupo de pessoas, mas acolher qualquer um que esteja disposto a curtir música fora das telas e dos fones de ouvido — e, quem sabe, descobrir algo novo no caminho.
Seja servindo um café ou tocando um disco, vocês estão, no fundo, criando um clima para as pessoas. Qual é a sensação principal que vocês esperam que alguém sinta ao ouvir um set do Batch Brew?
Acho que o que a gente quer passar é uma espécie de conforto. Ainda que aquele que esteja do outro lado não conheça as músicas, a ideia é que o som traga uma sensação quente para o ouvido e o coração, e que torne a experiência dela, onde quer que seja, mais agradável e memorável.
Foto: Clara Canepa
Acompanhe o trabalho do Batch Brew
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