
Ela constrói pontes onde havia muros. Uma conversa sobre o poder do encontro físico, a periferia como vanguarda e a “Excelência Travesti” como um ato de redefinição do futuro.
O trabalho de Turmalina é um ato de inverter o mapa. Como fundadora da PerifaCon e CEO da Madre Produtora, ela se dedica a criar pontes e desbravar espaços, levando o protagonismo da cultura para as bordas. Para ela, a cultura ganha em “verdade, diversidade e complexidade” quando a periferia deixa de ser tema e passa a ser autora da própria narrativa. Em um tempo de bolhas virtuais, ela defende o encontro físico como um terreno fértil para o inesperado. Seu projeto mais recente, a Madre Produtora, vai além da inclusão e propõe uma redefinição. Com o lema “Excelência Travesti”, ela afirma a identidade trans como sinônimo de potência, rigor e inovação. Nesta conversa, a empreendedora e agitadora cultural fala sobre comunidade e a criação de futuros possíveis. Para celebrar essa jornada, ela compartilha a playlist “Madre Celebration”, um mergulho em sua trajetória na música underground brasileira.
Turmalina, você é a fundadora da PerifaCon e CEO da Madre Produtora. Como essas duas forças, a da criadora que inventa mundos e a da empreendedora que os torna possíveis, se alimentam no seu cotidiano?
Criar pontes que conectam e geram oportunidades para quem está fora do espectro da hegemonia faz parte do meu DNA como empreendedora. A relação entre a PerifaCon e a MADRE Produtora nasce exatamente dessa chave, a de desbravar espaços que, muitas vezes, são negados a pessoas LGBTQIAPN+, racializadas e de periferia.
Sua assinatura é inverter o mapa, levar o centro para as bordas. O que muda na cultura quando a periferia deixa de ser tema e passa a ser autora, palco e protagonista da própria narrativa?
A cultura ganha em verdade, diversidade e complexidade. Isso porque não se trata mais de uma representação filtrada pelo olhar de fora, mas de narrativas construídas a partir da experiência de quem vive essas realidades. Há muito tempo os movimentos underground são os verdadeiros motores de inovação que depois alimentam o mainstream, especialmente na música. O exemplo mais evidente é o funk, que nasceu nas comunidades e vem ecoando nos maiores festivais do mundo, tornando-se referência global, mas, ainda assim, segue estigmatizado quando ressoa nas favelas e pelas vozes de quem, de fato, constrói o gênero.
O seu trabalho é focado em encontro e corpo presente. Como você enxerga o poder de criar comunidade no físico em um tempo em que o virtual parece sufocar tudo?
Enxergo nisso a retomada do inesperado e do poder de se surpreender, algo que o virtual vem nos roubando aos poucos. Estar junto no físico abre espaço para novas relações, para o olho no olho, para ouvir um som que não foi indicado por um algoritmo, mas que chega de forma orgânica e transforma. É nesse terreno do imprevisto que surgem as descobertas mais potentes, e é justamente isso que estamos em risco de perder.
A Madre Produtora se apresenta como “Excelência Travesti”. Num mercado que historicamente marginaliza corpos trans, como é para você afirmar a identidade travesti como sinônimo de excelência e entrega de altíssima qualidade?
Essa afirmação é exatamente para criar esse imaginário muitas vezes não associado à identidade travesti. A Madre surge para romper com isso, mostrando que o olhar travesti produz potência, rigor e inovação em tudo o que se propõe, seja em bookings, em produção, curadoria, design, o que for. Não se trata apenas de ocupar um espaço, mas de redefini-lo, trazer a nossa experiência como referência de qualidade e não como exceção. Excelência travesti é justamente essa capacidade de transformar exclusão em presença e criar caminhos de futuro onde antes só havia portas fechadas.
Seu trabalho é sobre futuros possíveis. Qual é a próxima porta que você sonha abrir para a nova geração de criadores da periferia?
Sonho com um mercado musical em que não seja preciso provar nossa qualidade dez vezes mais do que os outros para conquistar o mínimo. Um espaço verdadeiramente igualitário, onde as oportunidades não sejam filtradas por cor de pele, gênero, sexualidade ou origem, mas sim pelo que realmente importa: o talento e o trabalho.
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