Roberta Martinelli

A “garimpeira” da música brasileira que usa a curadoria como ponte: para ela, a novidade entra mais fácil na vida das pessoas quando vem acompanhada de um clássico.

Em um cenário musical saturado de ruído, Roberta Martinelli é a “garimpeira” oficial, a curadora cujo ouvido afiado serve de farol para o público e de vitrine para os artistas. Ela não é contra os algoritmos, mas defende a curadoria humana como um ato de intenção: o de apresentar a música brasileira que pulsa agora, conectando pontas e criando narrativas. Com um diagnóstico lúcido sobre 2025 — a arte vai bem, o mercado enfrenta desafios —, ela acredita que a principal força de um artista está em construir um som potente e um público fiel, furando as bolhas pela qualidade. Nesta conversa, a jornalista e apresentadora fala sobre seu processo criativo e os desafios da nossa música. Para ilustrar seu radar, ela montou uma “playlist de apostas e redescobertas”, misturando as novidades que a arrepiaram com os clássicos que merecem ser reouvidos. Aperte o play!

Você é uma das maiores “garimpeiras” da nossa música. O que um artista ou uma canção precisa ter para furar o ruído e capturar a sua atenção de verdade hoje?
Olha, pergunta de milhões nesse mundo que vivemos. Parece que esse chegar no ouvinte está cada dia mais difícil. Tanta coisa que temos, né? Mas o que eu acho que mais rola é o artista cuidar da carreira: se preocupar em fazer o som que quer e acredita, criar seu público, e aí a gente chega. Claro, não posso ser só romântica e entendo a importância de estar em programas, podcasts, colunas, mas não é para ser o objetivo final. Quando uma banda chega potente sonoramente, ela consegue ir furando bolhas. Fácil não é.

Como jornalista e curadora, você está na linha de frente da batalha entre a descoberta humana e as playlists algorítmicas. Qual é o maior risco que a gente corre ao deixar que robôs ditem o que vamos ouvir?
Eu não sou contra o algorítmico – já conheci coisas legais que me foram entregues por ele. Mas essa resposta já explica um pouco tudo: pode acontecer de ser bom, mas não é algo garimpado por uma pessoa que tem uma curadoria. O trabalho que eu faço nos meus programas é bem esse: escolher o que quero apresentar pensando na música brasileira que acontece agora. Mas dá para ter os dois.

Depois de tantos anos entrevistando e pesquisando, qual é o diagnóstico que você faz da saúde da música brasileira em 2025? O que mais te anima e o que mais te preocupa?
A música brasileira como obra de arte vai muito bem, brilhando como sempre com lançamentos maravilhosos. Como mercado, as dificuldades aparecem: está difícil chegar ao público, rodar shows em um país tão grande como o nosso, produzir mil conteúdos para redes. São muitos desafios que temos que pensar como trabalhadores da música e para alcançar o público.

Como é o seu processo criativo para montar um programa ou um podcast? Começa com uma descoberta musical, com um tema que precisa ser discutido, ou com a vontade de conectar artistas que aparentemente não dialogam?
Eu tenho alguns programas e penso a curadoria deles de forma diferente. O Cultura Livre está no ar há 16 anos e, desde o começo, penso nele como a música brasileira que acontece agora. O Som a Pino é um programa diário de música brasileira; nele, penso numa programação misturando clássicos e descobertas. Acho que uma música entra mais fácil como novidade na vida de alguém quando vem acompanhada de uma música que já sabemos cantar. Tenho também um programa numa rádio FM no Japão, onde toco novidades recém-saídas do forno, e faço a curadoria de um espaço muito especial que é o Sesi Lab — um museu de tecnologia em Brasília que tem uma noite chamada Night Lab, com shows, DJs e projeções. Modéstia à parte, é um lugar mágico.

Qual foi a última descoberta musical que te deixou genuinamente arrepiada e te fez pensar: “as pessoas precisam ouvir isso”?
Acho que foi o disco “Maria Esmeralda”, feito pelo Thalin, Pirlo, VCR Slim, L’angelo e Cravinhos. Eu ouvi o disco e fiquei impressionada com o trabalho e louca para ver como seria no palco. Quando estive no show de lançamento no Sesc Pompeia, tive certeza de que era um grande acontecimento da nossa música.

Fotos: Nadja Kouchi / Jade Monteiro e Otávio de Roque

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