
Dani fala sobre coragem, o poder da música para atravessar momentos difíceis e a necessidade de dizer “não” para o mundo para poder dizer “sim” a nós mesmos.
Dani Arrais é uma escritora e jornalista que investiga um dos maiores paradoxos do nosso tempo: como cultivar uma criatividade autêntica em um mundo que exige produtividade constante e nos afoga em estímulos? Cofundadora da agência Contente e diretora institucional do Coletivo Dupla Maternidade, seu trabalho propõe uma pausa para a contemplação e uma conversa honesta sobre os medos que nos paralisam. Ela defende o silêncio como ferramenta, a presença como ato revolucionário e o descanso como motor para novas ideias. E é nesse universo de reflexão sobre a vida, coragem e a busca pela autenticidade que a convidamos a compartilhar uma playlist muito particular: a trilha sonora da sua vida ou do que ela acredita que representa essa conversa. Encontre inspiração na entrevista da Dani Arrais: dê o play!
Dani, qual o maior desafio para a criatividade autêntica no mundo de hoje?
Conseguir ter tempo para contemplação, para fazer algo que não seja “útil”. Passear pela cidade, ver uma exposição por duas horas, encontrar uma amiga… E não só ser engolida pelo ritmo do fazer, fazer, fazer. Outro desafio é conseguir silenciar os estímulos externos. As redes sociais são máquinas de comparação constante. Se a gente fica só nelas, acaba querendo se encaixar no que, supostamente, funciona. E acaba esquecendo de olhar para o que é mais genuíno dentro da gente, deixa pra depois essa coisa tão importante que é se escutar pra deixar brotar o que nossa criatividade tem a dizer.
Como podemos usar a criatividade para buscar mais bem-estar e conexão real?
Bora pensar numa criança. Criança tá o tempo todo brincando, criando, inventando. É uma presença presente no mundo — e eu quis ser redundante aqui. Quando a gente olha uma criança sendo criança, a gente até pensa: em que momento a gente para de achar uma tampa de garrafa interessante? Quando é que um graveto no chão deixa de ser uma espada? Fico pensando em nós, adultos, mudando de uma tela pra outra, conectados o tempo todo. Fica difícil a gente não se sentir angustiado, agoniado, né? Então uma chave para usar a criatividade é tentar ficar presente no que a gente estiver fazendo. Conversar querendo ouvir, e não só esperando a nossa vez de falar. Colocar intenção no que a gente quer fazer. Dizer alguns nãos pro mundo, pra dizer sim pra gente, pro nosso tempo, pra criança que ainda habita em nós se divertir um pouco no dia a dia também. Ficar em estado de presença.
Pensando no seu livro sobre “não ter coragem”, que tipo de receio impede as pessoas de se expressarem mais, inclusive com música?
Medo do julgamento, sensação de que já está “tarde demais”, de que não dá pra competir com tanta gente tão talentosa com tantos feitos e tantos números, medo de errar, medo de não fazer diferença, medo até de fazer sucesso e não saber como agir a partir disso. A gente nunca teve acesso a tantos recortes da vida alheia. A gente vê os palcos de todo mundo, mas os bastidores só quem vive sabe. Ainda assim, as redes sociais nos dão essa ilusão de que “todo mundo” parece estar mais bem resolvido na vida. Como eu disse, uma ilusão. Mas uma ilusão que é repetida muitas vezes, todos os dias, então isso acaba influenciando na nossa percepção. A gente precisa cuidar desses ruídos externos para que eles não nos impeçam de trazer pro mundo o que só a gente pode fazer.
Qual música ou artista te inspira a ter mais “coragem” ou uma visão criativa e afetiva da vida?
A música “Sempre cantando”, de Moraes Moreira, me resgatou em um momento dolorido, em que precisei de coragem pra seguir. Ela tem um lugar muito especial na minha vida. “A dor não tem lugar permanente no coração de ninguém”, ele canta. E eu acho isso tão bonito. Tantas vezes a gente fica com medo de dar um salto maior. O que acontece quando a gente se aventura? Uma vez escrevi que cada vez que atravesso o medo, minha coragem muda de lugar. E escrevi essa música pensando em uma outra música que eu adoro: “Toda vez que eu dou um passo o mundo sai do lugar”, de Siba, meu conterrâneo.
Qual “mantra” ou conselho sobre criatividade você acha que já não faz mais tanto sentido atualmente?
Qualquer mantra que fale que a gente tem as mesmas 24 horas, que basta querer que você consegue fazer etc. Criatividade também demanda tempo. E tempo virou artigo de luxo. Então a gente precisa politizar a questão também.
Como você descobre ideias e iniciativas que trazem um olhar novo para a comunicação e as relações?
Quando eu leio, principalmente literatura. Mergulho em novos mundos, meu cérebro fica mais afiado, as conexões acabam acontecendo naturalmente. Quando descanso também. Sabe quando a gente tá com amigos, num domingo gostoso, aí de repente alguém fala uma coisa interessante, outra pessoa puxa outro fio? E, assim, fora da necessidade de performar, a gente acaba deixando as sensações fluírem, o cérebro criar.
Fotos: Lucas Viggiani
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