
Para enxergar o futuro, ele desliga o feed. Jorge Grimberg fala sobre a neblina dos algoritmos, a música como bússola cultural e os caminhos para atravessar a era da policrise.
Jorge Grimberg lê o presente para sentir o futuro. Um dos principais analistas de tendências do Brasil, ele não se contenta com a superfície dos algoritmos, prefere observar a vida. Investiga a neblina que encobre nossos desejos, questiona a autenticidade em tempos de feeds padronizados e busca os sinais onde eles nascem: nos lugares de paixão. Para ele, a música é o termômetro cultural mais preciso e sair das redes é o antídoto para escapar das bolhas. Nesta conversa, ele fala sobre seu método, as forças que movem o comportamento e sua previsão para a próxima década e apresenta a Playlist do Futuro Próximo, uma seleção de músicas que, para ele, já carrega o som, a letra e a atitude de onde a cultura está indo.
Seu trabalho é, essencialmente, ler o presente para decifrar o futuro. Onde você treina o seu olhar? O que, no comportamento das pessoas ou na estética de um lugar, funciona para você como um “sinal” de que um novo movimento cultural está nascendo?
Acredito que não existe um lugar para treinar o olhar, e sim que devemos aprender a observar a vida e estarmos abertos para ver as diferentes realidades à nossa volta. Nós vemos tanta coisa todos os dias no celular, mas o que realmente vemos? Os movimentos normalmente nascem em ambientes onde existe paixão. Pode ser um festival de música, uma semana de moda, um show, um destino de verão. Quando as pessoas se vestem em torno de algo que as emociona, estéticas originais podem nascer.
Você transita muito pelo universo da moda e do design. Para além da roupa ou do objeto, o que o desejo e a forma como consumimos hoje nos dizem sobre nossas ansiedades e aspirações mais profundas como sociedade?
Estamos em uma era em que, ao mesmo tempo que todos querem ser autênticos, a cultura dificulta o pensamento individual e até cria uma neblina entre nós e nossos desejos. Será que esse desejo é meu ou é do coletivo? Será que eu quero isso porque o algoritmo me mostrou muito ou porque é algo que eu realmente quero?
As bolhas criadas pelos algoritmos são uma grande inquietação. No seu trabalho, você precisa justamente furar essas bolhas para ter uma visão real. Como você faz sua curadoria de referências? E você acredita que os algoritmos mais nos ajudam ou nos atrapalham a entender o verdadeiro espírito do tempo?
Para sair das bolhas hoje, eu tenho que literalmente fechar o Instagram e o TikTok na hora de pesquisar e ir atrás das minhas referências. Pode começar com um post no Substack que me desperta uma ideia, uma pesquisa no WGSN que me provoca a pensar em algo, uma entrevista que li com um artista que me fez pensar em algo diferente. Eu hoje só consigo pensar fora do Instagram.
A música sempre foi um termômetro poderoso de transformações culturais. Que papel ela tem no seu radar de tendências? É através de novos artistas e cenas que você percebe para onde a juventude está indo, ou o som funciona mais como uma “trilha sonora” para as tendências que você já observa em outras áreas?
A música é provavelmente o mais forte termômetro cultural que influencia comportamentos. Ela expressa as emoções mais profundas das pessoas e também os estilos mais ousados de moda e beleza na busca por pertencer à determinada comunidade de um artista.
Quando vemos uma artista como Charli XCX, por exemplo, se apresentando com lingerie, bota e óculos escuros no Coachella, sempre com um drink e um cigarro na mão fora do palco, ela representa milhões de pessoas que bancam ser quem são e são imperfeitas sendo quem são. Em um show da Lady Gaga, os comentários dos fãs são: “você me permitiu ser eu mesmo”. É uma força sem comparação o impacto da música no comportamento.
Depois de analisar tantas tendências e o futuro de tantos mercados, qual é a principal mudança de comportamento ou de mentalidade que você enxerga no horizonte e que acredita que irá redefinir a nossa próxima década?
Depois de tantos anos nessa “policrise” (aquecimento global, saúde mental, custo de vida, guerras, crise econômica, etc.), a próxima década poderá ser marcada pela busca por soluções para todas essas crises e suas polarizações extremas. Os extremos que dominam todas as esferas da sociedade hoje em guerras ideológicas estão gerando mais solidão e separação do que harmonia e conexão. É tempo de as pessoas decidirem mudar e tomarem o tempo para descobrir como.
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